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Carta aberta da 19ª Festa Diocesana das Tendas

'Quando essas coisas começarem a acontecer, levantem-se e ergam a cabeça, pois a libertação de vocês está próxima'(Lc 21,28)

Nós, povo de Deus reunido na 19ª Festa das Tendas da diocese de Lages, SC, no município de Cerro Negro, no dia 29 de novembro de 2015, queremos manifestar nossa indignação, nossa solidariedade e nossa esperança.
Somos cerca de 4 mil pessoas, vindas de todas as comunidades da Região Serrana de Santa Catarina. Nestas terras e nestas águas de Cerro Negro, por onde passou o profeta João Maria nos tempos do Contestado, há mais de 100 anos, levantamos um clamor de justiça em favor de todas as vítimas das guerras que ainda assolam o mundo, da corrupção generalizada, das migrações forçadas e, mais recentemente da tragédia que tornou amargas as águas do Rio Doce em Minas Gerais e no Espírito Santo. Estamos acompanhando a dor de tantos irmãos e irmãs nossos: as populações ribeirinhas, os povos indígenas e quilombolas, os pescadores e toda a rica biodiversidade desta região que se transformou num grande mar de lama. Em nome da nossa fé no Deus da vida, não poderemos nunca nos calar diante da sede incontrolável de riqueza das grandes empresas que, em nome de um modelo de desenvolvimento insustentável, provoca destruição, violência e morte. Os lucros exorbitantes da mineradora Samarco, pertencente ao grupo Vale e à australiana BHP Billiton, é um escândalo diante de tantas manifestações de vida envenenadas e destruídas. Basta de impunidade, de ganância e de ambição. Como cidadãos e cidadãs brasileiros exigimos que as leis sejam cumpridas também pelos ricos e poderosos, que os responsáveis sejam punidos, que os danos ambientais e humanos sejam reparados, que as populações atingidas sejam justamente indenizadas, que os direitos de todos, começando sempre pelos mais empobrecidos, sejam assegurados; e que, às margens do Rio Doce, do Canoas, do Pelotas, do Caveiras, do Lava-Tudo e de todos os rios do planeta, "corram o direito e a justiça como fonte que nunca seca" (cf. Am 5,24).Com o Papa Francisco, clamamos: "O grito da Terra é o grito dos pobres da Terra".
Neste dia, quando celebramos em nossa diocese a abertura do Ano da Misericórdia, nossa indignação se transforma em solidariedade. Às vésperas da realização da Conferência Mundial sobre mudanças climáticas, em Paris, nos próximos dias 30 de novembro a 11 de dezembro, acolhemos o desafio do Cardeal Peter Turkson, presidente do Conselho Justiça e Paz do Vaticano: "Em 29 de novembro, a história nos chama a exercer a cidadania ecológica, seja em oração ou marchando. Todos somos convidados a participar ativamente desse grito mundial por nossa grande casa, por nossos irmãos e irmãs, vítimas da crise climática e ambiental, e pelas gerações vindouras. 'Laudato Si', a encíclica do Papa Francisco sobre o cuidado com o planeta terra, a nossa casa comum, é um chamado dramático à sensibilidade e solidariedade de todos nós. É um convite a construir o Reino de Deus através da esperança, do diálogo e da ação".
Assim, na simplicidade e na provisoriedade das tendas, o povo que vive em uma das regiões mais empobrecidas e com menor IDH do estado, nos ensinou que nos pequenos gestos da partilha do que somos e temos, sabemos e podemos, antecipamos um outro mundo possível e necessário e continuamos participando na construção de uma igreja e uma sociedade sem exclusões, sinais do Reino Definitivo.
"A esperança não decepciona, pois o amor de Deus foi derramado em nossos corações" (Rm 5,5). Neste primeiro domingo do tempo do Advento, a graça de Deus nos reuniu e nos enviou para "esperançar" o mundo com atitudes de encontro, cuidado e compaixão. Assumimos o compromisso de vencer as tentações do consumismo, as ambições do poder, as armadilhas da cultura da aparência e da indiferença. Esperamos a vinda do menino Jesus como a misericórdia de Deus que se faz gente e arma sua frágil tenda entre nós. 
Em nossas Diretrizes da Ação Evangelizadora, afirmamos que a igreja de seguidores e seguidoras de Jesus Cristo não pode ficar indiferente, mas sim convocar todas as pessoas que se relacionam com a Mãe Terra como "mãe da vida", a mudar seus hábitos e zelar pela criação, começando no cotidiano e indo até as atitudes mais proféticas, numa profunda espiritualidade ecológica. Por isso, com simplicidade e entusiasmo, em nossas famílias, nos Grupos de Família, em nossas comunidades, nos Conselhos de Políticas Públicas, acolhemos "o que é bom e o que Deus exige de nós: praticar a justiça, amar a misericórdia e caminhar humildemente com o nosso Deus" (cf. Mq 6,8).
Nós somos o povo serrano, queremos nos evangelizar no testemunho da misericórdia e da partilha. Queremos continuar construindo novas relações de cuidado com a vida, onde "ninguém mais precise ir embora" e onde "todos e todas tenham vida e vida em abundância" (Jo 10,10).
Cerro Negro, 29 de novembro de 2015.

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