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A GRATUIDADE DA RELIGIÃO
A religião não pertence ao reino da necessidade. Mas, mesmo no mundo moderno, permanece o anseio pelo transcendente, um ponto de interrogação que habita o coração humano. Quem surfa na existência ou entrega-se ao turbilhão da correria diária não ouve essa demanda. A religião é gratuita. Seu valor está naquele mais – o plus – que ela oferece para o bem de cada ser humano e não é encontrado nos limites da filosofia e da ciência, da técnica e do mercado.
Crer em Deus é viver de tal maneira que a vida não teria nenhum sentido se Deus não existisse. Isso não significa que as pessoas religiosas sejam melhores do que as outras. É possível que sejam piores, quando tratam Deus como quebra-galhos, tapa-buracos, pronto-socorro e até como subterfúgio para comportamentos fanáticos e violentos. O místico medieval Mestre Eckhart (1260-1328), reprovando os que buscavam a religião pelo dinheiro, recompensas ou consolações interiores, dizia que Deus não é uma vaca leiteira da qual se aufere lucros.
O teólogo inglês Timothy Radcliffe caracteriza os cristãos como os que têm “uma estranha esperança, que se revela precisamente quando parece não haver nenhum futuro, uma alegria suficientemente grande para nela caber a tristeza, uma liberdade que culmina em doar nossa vida, uma coragem que é um amor tão forte à vida que estamos preparados para morrer, e uma estima por nossa existência corporal” que os faz crer num Deus criador, que se encarnou nesse mundo e ressuscitará nossa carne mortal. Esperança, alegria liberdade, coragem e estima pelo corpo são virtudes humanas, próprias da pessoa que se supera a si mesma.
A religião a ajudará a abrir-se ainda mais, em vista de sua plena felicidade, na reconciliação com Deus, com as pessoas, com a natureza e consigo mesma. Esse plus é o que caracteriza a pessoa religiosa. Sem isso, diria São Paulo, “somos os mais dignos de compaixão” (1 Cor 15,19).
FELLER, Vitor Galdino. A gratuidade da religião. Diário Catarinense. Florianópolis, 20 de setembro de 2011.
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