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Dia dos namorados ... E dos desesperados

O dia dos namorados está se aproximando, vem doce e lento num barco em forma de cisne que sai do Túnel do Amor. Já viu isso em algum filme? É, pode ser, minha memória não é boa para detalhes.

O dia dos namorados está se aproximando, vem doce e lento num barco em forma de cisne que sai do Túnel do Amor. Já viu isso em algum filme? É, pode ser, minha memória não é boa para detalhes.

Quem, com certeza, ama essa data é quem divide-a. Ou os comerciantes, que lucram um bocado e então prefeririam não ter ninguém com quem dividir. O primeiro sinal de que a data está próxima é o preço dos presentes. Na semana passada você podia comprar flores e bombons por menos de R$ 50,00. O segundo é quando você vê seu chefe – aquele velho ranzinza e mal-humorado – dar um sorriso. O primeiro, dos três que ele dá durante o ano.

Começamos a notar as mudanças rapidamente. Primeiro, foram as lojas e os estabelecimentos comerciais que entram em clima. Agora são as estações de rádio e as salas de cinema. A programação das rádios muda dos artistas costumeiros (românticos) para os mais românticos ainda. Começa a invasão de Jota Quest, Fresno, sertanejo universitário e trilhas sonoras de novelas. Só hoje já ouvi quinze vezes, só hoje! Aquele cara que só assiste filmes violentos ou de terror, é convidado pela namorada para ver uma sessão melosa e sentimental. Ele aceita – depois de muita insistência dela – e vai, ainda meio contrariado. E às vezes acaba gostando tanto que, quando a garota chega pertinho e sussurra: "Amor, me beija..." Ele tá tão concentrado que nem ouve. E diz:"Depois querida, agora quero ver..." sem desviar os olhos da tela.

Os parques e praças se enchem de casais adolescentes que procuravam privacidade. Eles andam tão juntinhos que parecem ser uma só pessoa. Mas quem namora sabe que não é por falta de espaço que se anda assim, agarradinho. Usa-se então, como desculpa mais comum dividir os fones de ouvido do MP – algum número, que está repleto de músicas lentas que dão vontade de beijar. E isso tudo é realmente maravilhoso! Esse é o melhor dia do ano para quem tem alguém. E se você está sozinho (a) e desesperado(a) , esta é a chance de arranjar alguém, pois a procura por um par aumenta muito. Afinal, ninguém quer passar o dia doze em casa assistindo TV ou lendo crônicas.

É nessa época também, que as pessoas parecem perder um pouco o medo e o senso do ridículo, Surgem então, dos lugares mais improváveis e das pessoas que pareciam ser as mais sensatas,as mais extravagantes declarações de amor. Loucuras como subir em cima da mesa no restaurante lotado e cantar a música favorita da namorada, arrancando lágrimas e sorrisos dela (pela sua desafinação) e aplausos dos presentes. Enquanto os seguranças lhe arrastam para fora para arrancar-lhe o couro. Ou pintar toda a rua em frente à casa da amada com declarações doces e apaixonadas para chamar a atenção dela, enquanto os vizinhos chamam a polícia. Enfim, tudo o que a criatividade permitir e a lei não. Ou ainda, coisas menos românticas e mais práticas como depilar suas partes intimas ou presentear a sua garota com um langerie. Descobrem-se também, os poetas adormecidos e improvisados, os sensíveis, os que realmente amam. Vencemos medos e dificuldades. Alguns descobrem que estavam no lado errado do campo e deixam a namorada pelo primo dela que chegou essa semana do interior. E algumas meninas passam a achar as cuecas do namorado mais confortáveis. Afinal, o conceito de par é apenas dois.

Mas há quem não goste dessa data. Sim, há alguém que a detesta. É você mesma que está aí trancada no seu quarto, estirada na cama, ouvindo Evanescence e pensando na melhor maneira de morrer lentamente. Mas talvez essa seja a melhor. Você odeia todo esse clima: as flores, os bombons, os sussurros, os beijos, as promessas...E essas músicas melosas lhe dão náuseas. Você que está sempre séria, nunca sorri (é filha do chefe). Usa apenas roupas pretas ou roxas e maquiagem escura. Tem dois amigos, mas é um morceguinho de pelúcia. É de Virgem e provavelmente é a única garota da cidade que ainda é. O último cara que você beijou foi internado num sanatório o ano passado. E você se pergunta o que tem de tão diferente das meninas mais populares. Além de um cérebro.

Você que está sozinha no seu quarto. Esse dia será determinante na sua vida. Você se tornará uma grande escritora, muito famosa. Seus livros – melancólicos e desesperadores – venderão milhões de exemplares. Servirão de companhia e travesseiro para milhares de garotas sem namorado. As pontes das cidades estarão sempre cheias de meninas com seus livros amarrados no pé, prontas para se atirar – influenciadas pela leitura. Você será muito rica (já é) e ganhará muito dinheiro até se suicidar. Aos 27 anos.

Você está no seu quarto e acabou de ler isto. E está disposta a trocar todo esse futuro brilhante se alguém simplesmente bater na sua porta. Você descer para ver e encontrar um buquê de flores junto com uma caixa de bombons e um cartão. Mesmo que seja daquele nerd espinhento e desastrado que mora no fim da sua rua e a ama desde a sexta série... ele surge de trás dos arbustos para falar-lhe, tropeça e cai com a cara numa merda de cachorro. Você pega os presentes e fecha a porta na cara dele antes que ele possa falar alguma coisa. Está desesperada sim, mas nem tanto. Você voltará para o seu quarto e lerá de novo este texto. E, então, descobrirá que está apaixonada pelo autor e ligará para ele, que também não quer passar o dia dos namorados sozinho...

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