Quatro membros da família Durigon seguem o chamado da vocação sacerdotal
No interior do município de Anita Garibaldi, na conhecida comunidade da Cachoeirinha, estão as raízes de uma família especial por vocação.
Vocação? Sérgio, Willian, Douglas e Henrique, integrantes da família Durigon, decidiram seguir a vida do sacerdócio, e são os personagens dessa matéria.
Aproximava-se o fim do dia, da quarta-feira (28), o tempo estava nublado e endereçava que iria vim chuva pela frente. Foram doze quilômetros de estrada de chão, desde o fim do perímetro urbano até a casa dos Durigon. Chegando lá, uma grata surpresa. A família sob a coordenação do padre Sérgio, junto a irmãs religiosas, preparavam-se para iniciar a santa missa, e naquele ambiente com ar de fé foi rezada a celebração.
Era a última noite das férias dos irmãos Willian e Douglas na casa da família, pois as malas já estavam prontas para seguir viagem a mais uma etapa da vida religiosa.
Sérgio, o efetivo padre da família, com brilho no olhar iniciou a conversa falando sobre suas origens familiares e a trajetória na vida sacerdotal.
Filho de Ida e Cárpi Durigon, um entre cinco irmãos, Sérgio voltou a memória no passado e nos contou sobre o seu chamado vocacional. “É difícil me esquecer daquele 08 de dezembro de 1979, quando terminávamos o primeiro grau e uma irmã do colégio de Anita nos disse que não poderia dar um presente para cada um de nós, mas que nos presentearia coletivamente. Ela convidou um padre para dar um retiro a nós, na comunidade do Divino. Foi um dia de oração e meditação. Quando voltei para casa, estava chovendo, e eu mesmo descoberto de proteção não senti nada de chuva. Estava tão contente dentro de mim, que não conseguia conter aquela alegria. Quando cheguei em casa meu pai já estava descansando, e minha mãe estava na cozinha, foi então que disse para ela: mãe, eu vou ser padre! Ela chamou meu pai e assustada contou a notícia. Eu tinha outras programações para meu futuro, mas aquele retiro mudou a minha vida”.
Sérgio entrou no seminário em 1980. Os três primeiros anos, enquanto terminava o ensino médio, morou na cidade de Guaporé/RS, um ano de Noviciado em Passo Fundo, um ano em Sarandi e dois anos de Filosofia em Caxias do Sul. Em 1987 se dirigia para Roma, na Itália, onde fez cinco anos de Teologia, três anos de bacharelado, e dois anos de mestrado. De 2003 a 2005 fez o doutorado em Roma.
Perguntado sobre o que o levou a seguir o sacerdócio, Sérgio respondeu com segurança e fé: “o que me levou a fazer todo este percurso de vida foi um chamado de Deus, que fui descobrindo aos poucos. No princípio não era tão claro. Eu era criança quando comecei a pensar em seguir a vida religiosa, e depois fui amadurecendo essa escolha. Cheguei à decisão em 1980, quando fui para o seminário e depois fui seguindo o caminho de amadurecimento da vocação”.
Sobre seus pais, ele orgulhosamente, com sorriso nos lábios falou: “a presença dos meus pais foi constante, de carinho e decisiva para a minha vida, todavia nunca me obrigaram a fazer uma coisa ou outra, eles me deixaram livre. Eu aprendi a base da minha vida com eles. Sem os nossos pais não somos nada”.
Carinho e orgulho também quando citou a sua cidade e comunidade natal: “Volto para casa, celebro missa aqui e visito a minha comunidade e percebo com muita alegria que eles têm um grande carinho por mim, assim como eu também tenho com todo o meu povo, pois o aconchego de casa é inigualável. Tenho laços de tipo afetivo e cultural com minhas origens”.
Há opiniões paralelas quanto a escolha pela vida religiosa. Padre Sérgio comentou que costuma brincar sobre essas opiniões. “São poucos aqueles bobos que querem seguir a vida de padre. É uma vida boa. Olhando pelo lado econômico, o padre tem uma vida tranquila. Ele não precisa pagar aluguel, nem impostos, nem empregados, nem seguro de saúde... todas estas coisas estão cobertas. Ele não tem família, e por isso nem dor de cabeça para criar filhos. Não tem essas preocupações afetivas. Nestes aspectos, quem disse que padre tem uma vida boa, acerta completamente. Agora, sobre os desafios do padre: é uma vida só, sem relação afetiva única e sim de forma ampla e aberta para todos; vive em comunidade com pessoas de diferentes culturas, idades, formações..., também não temos lugar fixo. Trabalhamos com pessoas que nos ajudam, as vezes nos dificultam, ou até impedem o trabalho. Mas e então, por que padre é padre? Porque entendo que existe um chamado de Deus, e a sensação maravilhosa de saber que eu tenho coisas que o dinheiro não pode comprar. Sou feliz mesmo com os grandes desafios. Isso faz da vida de um padre uma vida plena”, revelou o religioso, que acrescentou sobre o cotidiano e bons frutos do sacerdócio: “o padre que dedica tempo a oração e as pessoas, faz da vida dele uma vida cheia de realizações. Porque naquele misterioso encontro entre Deus e a sua misericórdia, e a nossa fraqueza, mas a bondade dele, faz com que a gente dê passos que outras pessoas não conseguem dar, pois não tem essa dimensão de Deus na própria vida”.
Sérgio optou por ser missionário. “Quando estava no período da Filosofia, três seminaristas de Roma viam estudar em São Paulo, e três brasileiros iriam para lá. Eu disse para o reitor da época, que estaria disponível, e ele me respondeu: - você pode ir. Essa ida para Itália me abriu o mundo, a cabeça, o ventre, o coração e a alma, para ser abrangente no sentido de não me fechar nas minhas seguranças”.
Atualmente padre Sérgio, com 50 anos, está em Johannesburgo, na África do Sul, onde trabalha com pároco em três paróquias na Região Sul da cidade. Utilizando de dialetos em português, inglês, francês e zulu nas celebrações. “Vivo e trabalho na África, sou feliz ali mesmo com os muitos desafios, de ordem cultural, intelectual, social, religiosa e étnica”, concluiu.
Três sobrinhos no mesmo caminho de fé
Willian e Douglas são filhos de Ivaldo e Henrique é filho de Marilúcia, ambos irmãos de padre Sérgio.
“Eu nunca me senti tão responsável por meus sobrinhos quanto nessas fases das vidas deles atualmente, porque eles estão tomando decisões definitivas. Gosto e quero acompanhar este percurso. E disse-lhes: não tenham medo, pois Deus está chamando-os, é só responder com fidelidade, que vocês não se arrependerão”, disse Sérgio, acrescentando: “que benção eu poder pedir um dia para os meus sobrinhos que eles perdoem meus pecados, que me abençoem. Por que até hoje foi o tio quem fez isso. Gostaria de ter ao lado do meu leito de morte um sobrinho para eu me confessar”.
O tio ser padre é um espelho e exemplo para os jovens seminaristas. Douglas pontuou sobre isso: “Não nos espelhamos em somente um padre, buscamos o que tem de bom em todos eles. Mas, nosso tio Sérgio, foi uma bela influência para nós, pois crescemos nesse ambiente de fé”.
Willian, hoje com 18 anos, nos contou sobre o seu chamado ao sacerdócio: “a minha decisão foi após um culto, que teve em nossa comunidade em agosto de 2011. Depois desse momento eu senti algo diferente. Quando retornei para casa pedi para a minha avó me contar sobre a trajetória do meu tio, e nessa conversa disse para ela que estava decidido em ir para o seminário. Na escola quando falava para os meus colegas que havia tomado essa decisão eles se espantavam. Foi um momento de grande entusiasmo e alegria. Nunca me esqueço do dia 28 de fevereiro de 2012, em que cheguei ao seminário em Passo Fundo/RS, me recordo de cada detalhe. Sabendo que a partir daquele instante lá seria a minha casa, os meus colegas seminaristas os meus irmãos e aquela a minha família. Minha vida mudou, eu nunca mais fui o mesmo”.
Douglas, um ano mais novo que seu irmão Willian, foi convidado a conhecer essa experiência e logo se encantou pela vida religiosa. “O pároco padre Silvio, de Anita, sempre estava me convidando ao caminho sacerdotal. Foi então que ele me convidou a participar de um retiro em um seminário na cidade de Bom Retiro/SC, e embora eu já convivesse com familiares seminaristas o ambiente daquele local me encantou de forma diferenciada. Então fui para o meu primeiro estágio vocacional, era Deus me chamando. No segundo estágio vocacional decidi em seguir o caminho do sacerdócio. Na época eu trabalhava, morava sozinho e estudava, optei por largar tudo e seguir outro rumo. Faz um ano que estou no seminário e quanto mais convivo mais eu gosto desse caminho. Não me arrependo de nada em minha escolha. O chamado tem que partir de si, é preciso conhecer e enfrentar o medo, porque naquilo a gente pode se encontrar”, comentou.
O caminho até tornar-se padre é longo, Willian nos explicou sobre as etapas. “É um ano do propedêutico, que é um ano de preparação a Filosofia, depois inicia a faculdade de Filosofia, a qual dura 3 anos. Em seguida são 4 meses de Postulantado e 1 ano de noviciado, para fazer os votos da profissão religiosa. A partir disso tem mais 4 anos de Teologia”.
Para manter-se no seminário, Willian, Douglas e Henrique, precisam contribuir com a mensalidade de R$ 500,00 cada. Qualquer pessoa pode lhes ajudar contribuindo como benfeitores, doando a quantia que desejar. Para isso basta procurar suas famílias.
Quando perguntados se um dia pensaram em desistir, os três entrevistados disseram que sim.
Para Sérgio: “o medo de não conseguir é um grande desafio, pois é uma decisão para sempre. Mas hoje não é mais o medo, e sim o prazer da partilha. De poder olhar para trás e dizer que valeu a pena”.
Já Douglas e Willian acrescentaram que é um grande desafio deixar a família e os amigos. O medo de se comunicar e ser social com todas as classes também foi citado pelos seminaristas.
Os quais destacaram como base fortalecedora a família. “Eles sabem que é um caminho muito bom, que estamos bem. Nós estamos muito felizes e essa felicidade é também deles”.
No amanhecer da quinta-feira (30), Douglas viajou para Lages, e Willian e Henrique (21 anos) foram para Curitiba, todos voltando das férias e iniciando mais um ano do caminho de fé.
Sérgio retornou para a África do Sul na quarta-feira, dia 4 de fevereiro, para continuar a trilhar os seus passos missionários.
Aos pais dos seminaristas e do padre, aos avós, a comunidade da Cachoeirinha e ao município de Anita ficaram e permanecerão o orgulho e a alegria destes quatro religiosos. E quando a saudade bater, o lugar de encontro será nas orações.
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