Remédio mal administrado
A tributação desmesurada pelo governo, a ganância da indústria farmacêutica e a fiscalização ineficiente compõem o coquetel de insensibilidades que tornam os medicamentos vendidos no Brasil infinitamente mais caros do que seus congêneres em outros países. Trata-se de uma situação absurda, que desafia as autoridades da área da saúde, pois esta verdadeira extorsão consentida acaba agravando doenças e provocando sofrimentos em muitos brasileiros. O poder público tem o dever de enfrentar logo esta questão, impondo uma ampla revisão da carga tributária imposta e uma fiscalização mais rigorosa sobre as diversas etapas que antecedem a aquisição pelos consumidores, que vão da produção à distribuição. Só o controle total por parte do público e a desatenção ao sofrimento que discrepâncias tão acentuadas geralmente provocam em enfermos com necessidade de se medicar podem indicar as razões dos verdadeiros absurdos enfrentados cotidianamente nos balcões das farmácias e na pressão sobre os custos dos hospitais e postos de saúde. No Brasil, por exemplo, paga-se sete vezes mais que em Portugal pelo mesmo cloridrato de tansulosina, medicação para tratamento de hiperplasia da próstata. O valor de um medicamento de uso contínuo usado para baixar o nível de colesterol cai para menos da metade no Uruguai, quando comparado ao pago pelos brasileiros. As deformações são tão acentuadas, que muitos doentes se vêem levados a fazer um turismo forçado no exterior, na expectativa de adequar um pouco mais o valor despendido com remédios ao percebido como salário. Uma simples conferida na fatia de cada um nesse lucrativo negócio baseado no sofrimento alheio ajuda entender por que o preço tornou-se proibitivo para uma grande parcela dos brasileiros. Só o governo fica com nada menos de 33,9% do valor final pago pelo consumidor por uma caixa de 30 comprimidos do mesmo cloridrato de tansulosina citado anteriormente, apenas sob a forma de impostos. O restante dos ganhos é disputado por meio de parcelas generosas por parte da própria indústria, dos atacadistas e do varejo. O agravante é que nessa cadeia perversa de ganhos desmedidos persistem práticas inconcebíveis com a realidade atual do mercado e que, por isso, não têm mais como ser toleradas. O país conseguiu avançar de alguma forma nessa área quando colocou em prática alternativas como os genéricos, que tornaram os preços finais mais acessíveis. O alcance porém, é restrito, pois só há produtos disponíveis em alguns casos específicos. É mais do que hora, por isso, de se procurar avançar mais, criando condições para que os preços dos produtos farmacêuticos guardem alguma proporção com os cobrados em outros países, muitos dos quais de poder aquisitivo superior ao do Brasil. O país precisa fazer sua parte para reduzir, e já, o custo dos medicamentos, abrindo mão de impostos e agindo com mais rigor para coibir excessos inadmissíveis entre a linha de produção e o balcão da farmácia. Referência: Diário Catarinense – Editorial. Remédio mal administrado. Florianópolis, 15 de novembro de 2011.
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