Lages recebe nesta semana mais uma edição do Programa Alesc Itinerante
Mãe e filho merecem um cuidado especial, da gestação ao parto
'Humanizar o parto é um conjunto de condutas e procedimentos que promovem o parto e o nascimento saudáveis, pois respeita o processo natural e evita condutas desnecessárias ou de risco para a mãe e o bebê'. (OMS, 2000)
Nos últimos dias tem se falado bastante sobre: "Parto Humanizado". O termo gera indagações, justamente pela importância que é o nascimento de uma nova vida e o cuidado com quem está gerando-a.
O Correio dos Lagos conversou com a gestante Vanusa Borges, de Anita Garibaldi, que aguarda pelo nascimento da segunda filha. Ela teve o primeiro parto em 2011 e precisou ser por cesariana. "A opção por cesariana foi do meu médico, porque naquela gestação apresentava Placenta Prévia onde a indicação era esse tipo de parto. Mas aguardamos as 40 semanas", comentou.
Quando perguntada sobre a visão dela como gestante sobre Parto Humanizado, ela relata que apesar de não conhecer muito sobre o assunto é um direito de todas que precisa ser respeitado. "Atualmente com a aprovação da lei sobre Violência Obstétrica muito se vê e ouve falar do Parto Humanizado. Eu confesso que tenho pouco conhecimento sobre o tema. Mas tenho a convicção que todas nós deveríamos ter direito a um parto que valorizasse a autonomia da mulher e o tempo do bebê. Indiferente da via de parto", destacou.
As vésperas do nascimento da Elisa, aos oito meses de gestação, Vanusa disse que já tem a decisão sobre o tipo de parto. "Na minha segunda gestação, também pela opção do meu obstetra e minha, pelas minhas condições de saúde, a Elisa nascerá de parto cesárea, respeitando o prazo".
No contexto do Parto Humanizado o respeito com a mãe e o bebê são fundamentais, e esse tratamento cuidadoso inicia desde o pré-natal, não apenas no parto.
Chegado ao momento de "dar a luz", em Santa Catarina a mulher está protegida sob a Lei Estadual 17.097/2017, que prevê: Informação e proteção à gestante e parturiente contra a violência obstétrica em Santa Catarina.
Para comentar a respeito dessa legislação e o que se trata a violência obstétrica, o Correio dos Lagos conta com o apoio de profissionais da área da saúde, graduados e acadêmicos de Medicina. Confira:
Violência obstétrica: um ato de desumanidade
Dentre os acontecimentos na vida humana, nenhum é tão permeado de antagônicas emoções quanto o parto. O ato de "dar a luz", processo responsável pela perpetuação da espécie, traz consigo a felicidade imensurável que é ter um filho, mas também desperta profunda ansiedade nos pais e na equipe de saúde na busca de que tudo ocorra da forma mais adequada possível. Dentro desse contexto, o cuidado com a mãe e o bebê na sala de parto deve ser redobrado, de modo que toda a atenção se volte para a concretização da idealização cultural que é parir. Quando a conduta da equipe vai de encontro à expectativa da mãe, acarretando prejuízos somato-psíquicos de qualquer espécie, surge naquele momento mais um ato de violência obstétrica.
Ainda que a violência obstétrica ocorra há muito tempo, apenas em 2014 a Organização Mundial da Saúde se manifestou contra práticas classificadas como inadequadas na sala de parto. O primeiro debate científico sobre o assunto é do ano de 2000 apenas. A violência obstétrica caracteriza-se, segundo o artigo 2° da lei 17.097, sancionada em janeiro deste ano em Santa Catarina, pelo governador João Raimundo Colombo, por "todo ato praticado pelo médico, pela equipe do hospital, por um familiar ou acompanhante que ofenda, de forma verbal ou física, as mulheres gestantes, em trabalho de parto ou, ainda, no período do puerpério".
Ainda na mesma lei, toma-se como exemplo de violência obstétrica tratar a gestante ou parturiente de forma agressiva e não empática, assim como negligenciar a dor da paciente ou utilizar-se de chacotas para constrangê-la. A sanção da lei vem em resposta a diversos (embora recentes) estudos científicos na área, bem como aos frequentes relatos de mães que sofreram algum tipo de agressão na sala de parto. Segundo a pesquisa "Mulheres brasileiras e Gênero nos espaços públicos e privado", realizada pela Fundação Perseu Abramo, 1 em cada 4 parturientes já sofreram violência obstétrica, sobretudo na rede pública de saúde. Embora o estudo abranja apenas o parto por via vaginal, estima-se que os números são próximos nos partos por cesariana. Ainda que se trate de uma pesquisa confiável, seus números devem subestimar a realidade. Isso porque muitas mulheres sofrem alguma forma de violência obstétrica e não a reconhecem, sendo uma herança da medicina paternalista que vivíamos há bem pouco tempo, na qual apenas a opinião do profissional era valorizada.
Já está mais do que definido que a violência obstétrica desencadeia diversos traumas físicos e psicológicos. Segundo a psicóloga Vera Iaconelli, diretora do Instituto Brasileiro de Psicologia Perinatal - Gerar, e doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo, a violência obstétrica relaciona-se com problemas futuros, como dificuldade em relacionar-se com o parceiro, depressão pós-parto, distúrbios de ansiedade (como o transtorno de estresse pós-traumático), entre outras disfunções. O sentimento de desamparo permanece por longos períodos e sua resolução pode ser lenta e incompleta, requerendo muitas vezes de ajuda psiquiátrica.
Assim, com base nos achados de altas taxas de violência obstétrica, de desinformação popular sobre o assunto e de repercussões negativas para a parturiente e seu grupo familiar, fica clara a necessidade de orientação das mulheres para que reconheçam e denunciem atos de violência obstétrica. A prevenção do ato deve fundamentar-se na divulgação maciça em meios midiáticos, clínicas e hospitais públicos e privados. As equipes de saúde devem ser qualificadas com excelente treinamento que vise os cuidados ideais com a futura mãe e, acima de tudo, exercer sem limites o processo de empatia e de escolha da paciente. Em casos em que a mulher já tenha sofrido violência obstétrica, a denúncia é a principal forma de combate, devendo ela encaminhar-se à Defensoria Pública de seu município a fim de esclarecer a situação. A principal forma de violência obstétrica é não respeitar a humanidade da mãe.
Rafael Amorim Lopes, acadêmico do 9º período do Curso de Medicina da Universidade da Região de Joinville - Univille, coordenador da Liga de Medicina de Família da Univille.
Sabrina Floriani, médica de Família, professora do Curso de Medicina da Universidade da Região de Joinville - Univille, coordenadora da Liga de Medicina de Família da Univille.
Wagner Jardim, acadêmico do 9º período do Curso de Medicina da Universidade da Região de Joinville - Univille.
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